sábado, 10 de outubro de 2009

High Fidelity

O tópico que me levou a escrever nesta tarde de Sábado não será nem crítico nem ostensivo. Pois, eu sei e, sim, é verdade que se não houver confrontos e rancor isto fica aborrecido e sem piada. Contudo se tiverem a paciência de ler a muralha de texto que se segue, verão que a minha escrita hoje, apesar de comedida e delicada, irá, de igual forma, despertar a vossa atenção. Por isso puxem de um cigarro (e acendam-no, dá jeito), acomodem-se na vossa cadeira e oiçam as informações que roubei a websites e fóruns alheios sobre aquele que considero, o melhor carro do mundo.


Imaginem-se em 1970. Acordam, vestem as vossas calças de ganga justas "à boca de sino", enfiam-se dentro de uma apertada camisa alaranjada com golas enormes, calçam as vossas botas estilo "cowboy" e saem para ir tomar o pequeno almoço.
Sentam-se, pedem um café e uma torrada (entretanto está a passar a "Whole Lotta Love" dos Led Zeppelin na rádio), agarram no jornal e...








Pois, é mais ou menos isto.
Foi "ontem" apresentado no Turin Car Show de 1970 o Lancia Stratos.

Sinceramente eu pensei em acabar o post aqui, visto que se alguém se lembra do tipo de carros que foram feitos nos anos 70, só o design deste protótipo é arrebatador o suficiente para o vosso dia ter valido a pena.
Mas visto que a história do carro é muy ilustre e distinta, achei por bem satisfazer um pouco mais da curiosidade dos visitantes incautos que não conhecem o carro.


Esculpido, em grande parte, devido a uma enorme bateria de testes a que foi sujeito nos túneis de vento, este belíssimo design de Marcello Gandini foi desenhado apenas e só com um propósito: rally. A Lancia já tinha tido vitórias com carros de competição no início do século XX, chegando mesmo a fundir-se com a Ferrari e a ganhar o Campeonato do Mundo com Juan Manuel Fangio ao volante. No entanto, os enormes custos levaram a companhia italiana a abandonar a competição, para regressar apenas há uns anos atrás (desta feita para o rally) com o Fulvia.

A meu ver, contudo, os grandes triunfos da Lancia começaram com o Stratos.



Até esta altura, todos os carros de rally eram apenas adaptações de carros de produção. O Stratos foi desenhado de raiz para corrida. Sem vidro de trás, pequeno, com uma enorme largura entre eixos, com óptima visibilidade à frente, robusto e leve, entrou no Mundial de Rally a gerar clamor e admiração.

Para receber a homologação, 492 unidades foram produzidas e equipadas com o motor V6 do então defunto Ferrari Dino, o Stratos tornou-se uma lenda de rally dos anos 70.
Ganhou o Campeonato do Mundo de Rally em 1974, 1975 e 1976, e só não continuou devido à fusão da Lancia com a Fiat, que acabou por o retirar para dar primazia ao Abarth 131.
Com Sandro Munari ao volante, para além destes recordes, 13 outras vitórias foram obtidas, entre elas uma edição do rally de Portugal em que Munari fica em 1º e os outros 3 Stratos que correram, em 2º, 3º e 4º.
No entanto, foi numa equipa privada, Chardonnet of France, que o Stratos alcançou o maior número de vitórias pelas mãos de um só condutor: Bernard Darniche venceu 33 competições.

Para a história fica um episódio caricato que ilustra de forma inequívoca a resiliência deste fantástico automóvel.
Numa edição da prova "British RAC" (competição em que o Stratos nunca ganhou), o carro, apesar de um bom começo, acabou por partir a transmissão. Numa das paragens previstas, e assim que surgiu oportunidade, os mecânicos tentaram imediatamente remediar a situação. Devido ao difícil acesso aquela zona do carro, a parte de trás da carroçaria foi removida. Sem tempo para a voltar a colocar, o carro partiu assim para as etapas seguintes da competição.



E nas 72 etapas seguintes conseguiu os 40 tempos mais rápidos. Acabou, porém, por ser desqualificado por andar sem luzes traseiras e outros adereços "importantes".

Não me interpretem mal, não é o carro de rally mais bem sucedido. Não detém nenhum recorde excepcional. Mas é, sem dúvida, o meu favorito.
Pelo "avant-garde" da sua construção e do seu design.
Pelas suas vitórias e triunfos.
Pelo impacto que o intelecto e força humana podem deixar em cada apaixonado pelo mundo automóvel.


Cumprimentos,
Stratos